Carretera Austral, 24 de novembro a 11 de dezembro de 2011.
Reserva Nacional Cerro Castillo
Paramos no camping da reserva e o guarda florestal nos comentou sobre o passeio dentro da reserva, uma trilha de 40 km, onde tem várias paradas para camping. Perguntei o que mais me interessa, se tinha chuveiro, ele disse que não. Mesmo assim vi o brilho no olhar do Julio e dos polacos com o sentimento claro de que iríamos nos aventurar. Dormi torcendo para que chovesse, quem sabe eles mudariam de idéia. Só piorei a situação, pois mesmo chovendo, todos acordaram empolgados arrumando as malas e eu interrogando o guarda para saber mais detalhes sobre esta pequena caminhada. O “amável” guarda me tranquilizou dizendo que era um caminho tranquilo, que não era 40 km, mas sim 26 km, e o caminho era quase todo plano. Ok, coloquei uma bota velha de guerra, prestes a alcançar os seus últimos dias de glória antes de seu enterro, uma mochila com o mínimo de coisas possíveis, pois meu joelho já estava dolorido fazia alguns dias, joguei o peso das comidas pro Julio… óbvio.
Pegamos os horrorosos mapas com a rota da trilha e começamos, junto com a agradável chuva. Primeiras dificuldades, rios, não é qualquer rio caros amigos, mas sim rios de descongelamento das gelereiras, e ponte… hauhaua… quem dera! É levantar a calça, tirar sapatos e encarar um $%*# frio que parece que estão enfiando agulhas no teu pé, as pedrinhas doem pra dedeu. Ok, a gente sobrevive! Mas para nossa alegria tínhamos mais alguns outros rios pela frente. Minha bota já estava encharcada pela chuva, nem isso para esquentar o meu pé após os rios. Mas faz parte, depois de 13 km chegamos ao primeiro camping, fizemos uma fogueira e esquentamos os pés.
Segundo dia, a trilha começou a tomar um rumo estranho, era apenas subida, mas para onde estávamos subindo? Comecei a xingar o guarda de todos os nomes não amigáveis que me vinham à mente, era para ser um caminho tranquilo, mas as subidas começaram a ficar mais íngremes e, de repente, estávamos andando pela neve, que linda neve!
Lindo nos primeiro 100 m de subida, depois que a gente afunda o pé, entra neve dentro do sapato e você percebe que seus dedos começam a ficar dormentes, a beleza se transforma num verdadeiro inferno.
De vez em quando, para melhorar, o pé afunda até encontrar um riozinho de água de desgelo logo abaixo de você. Mas aí você continua, quase desistindo, chorando, xingando e pensando, pra baixo todo santo ajuda.
Do outro lado da montanha… Cacilda… íngreme e com muito cuidado para não descer de esqui bunda e terminar se estoporando nas pedras. Na descida encontramos um casal de chilenos, eles adoram montanhismo, mas eles tem equipamentos adequados para tal, estavam com todos os aparatos necessários, muito diferente de nós que estávamos espremendo as meias. Para nossa surpresa, terminamos os 26 km, mas a trilha não terminou, ainda tínhamos mais 15 km. *&¨%$#@ do guarda. Mais uma noite secando os pés e ficava lá hipnotizada pelo fogo, esperando a água esquentar para tomar um banho de canequinha naquele climinha fresco, lembrando que íamos dormir na nossa minúscula barraca e quando digo minúscula, é por que a nossa barraca parece um caixão, o teto quase encosta na nossa cara. E sentindo dores por todo o corpo, o joelho latejando, os ombros quentes, parece que em dois dias envelheci uns 50 anos. Pelo menos estava feliz, pois era o último dia, mas ao mesmo tempo assustada, pensando o que mais teríamos pela frente.
Terceiro dia. Sabia que teríamos um lago, mas quando chegamos próximo do lago que ficava em meio a montanhas bateu um desespero, comecei a chorar quando vi que teríamos uma montanha enorme para subir. O choro de repente se transformou em um acesso de raiva e essa raiva me deixou louca e soltei um berro muito alto no meio do vale e comecei a subir como louca, em linha reta, sem olhar pra trilha ou fazer zigue zague, comecei a saltitar sobre as pedras como uma insana, retardada, parecia que dava pra sentir os genes de meus antepassados primatas, todos ficaram para traz. Claro que nesse momento dei varias topadas, mas isso meu pé só foi sentir momentos depois. Conclusão: raiva é um ótimo combustível. Óbvio, não esquecendo sempre de xingar o guardinha. Eis que finalmente chegamos ao cume, todos animados com a conquista, olhava para os retardados que estavam lá em cima com uma sensação de satisfação e pensava, por que eu não sentia isso! Hmmm, será por que estou me sentindo suja, cansada, com frio, irritada? Talvez. Pelo menos vimos condores voando, um momento de paz e apreciação.
Hora de descer, o problema agora era encontrar uma trilha de descida, era uma descida íngreme e de cascalhos, mais ou menos uns 2000 m de altitude. Dava pra surfar sobre os cascalhos. Durante toda a trilha a sinalização que indicava os caminhos era péssima, e nessa descida a situação piorou ainda mais, perdemos muito tempo buscando sinais de direção, já que o mapa não ajudava muito.
Depois de muitos tombos, escorregões, a mão ralada, terminamos a parte dos cascalhos, aí facilitou muito! Começou a descida por terra, estávamos muito cansados, já estávamos caminhando a umas 8 horas seguidas sem parada pra lanche, mas tínhamos que continuar. Os polacos que sempre estavam pra trás aceleram o passo nos últimos km. Quando terminamos a trilha tínhamos somente 6 km até chegar a vila para conseguir pegar um ônibus até o camping da reserva onde deixamos o carro. 6 km? Pareceu 56 km pra mim. Pedi pro Julio pra acampar por ali porque não dava mais, as coxas tremendo, o joelho latejando, os olhos irritados… Não dá mais!!! Eis que aparece um carro!!! Pensamos: “nossa salvação”. Cheio de bêbados malucos. Pelo menos fomos até a vila… com medo, mas fomos. Da vila até a reserva eram uns 26 km e chegamos às 11 da noite, tentamos pedir carona, eis que chegam os polacos com um chileno típico gaúcho, ele disse que poderíamos ficar na casa dele que teria espaço para todos. Sem palavras para dizer o quão querido o Carlos foi, nos preparou a janta e nos ofereceu a casa dele pra ficar. No outro dia pegamos carona com mais um chileno que dirigia loucamente, cortando as curvas. Tá louco meu! Mas chegamos vivos. Finalmente!!!!!!!
Bahia Murta
Infelizmente nos desencontramos com os polacos e seguimos para Bahia Murta. Lá resolvemos ficar dois dias para nos recuperarmos. Meu joelho estava inchado como uma bola, parecíamos dois velhos! Conversamos com Silvia, uma simpática senhora que aluga cabanas na região, ficamos numa cabana muito simples, porém aconchegante.. Se tivéssemos mais tempo com certeza ficaríamos vários dias a mais. Todas as manhãs Silvia prepara pães caseiros no fogão a lenha, estes pães quentinhos com uma manteguinha com certeza foi uma das melhores comidas da viagem, se bem que a janta que ela nos preparou foi simplesmente uma delicia. Claro que ficamos mais um dia.
Puerto Rio Tranquilo
Pegamos um pequeno barco em Puerto Rio Tranquilo e fomos em direção às grutas de mármore que são diversas grutas que parecem ter sido talhadas à mão, mas isso foi obra da natureza que combinou blocos claros de mármore, uma lagoa incrivelmente azul e vento para esculpir durante anos esse maravilhoso cenário.
O barco entrou em várias grutas, para que pudéssemos tirar fotos, tocar no mármore. Entre as grutas estão a catedral e a capela, onde você salta do barco e fica ilhado.
Na volta o vento ficou forte e as ondas na lagoa também ficaram. A viagem que na ida foi muito rápido, na volta pareceu levar uma eternidade. O barco teve que ir muito devagar, pois haviam muitas ondas e com somente em 4 pessoas à bordo não havia peso o suficiente para dar estabilidade, tivemos que sentar no chão do barco para que ele não quicasse tanto sobre as ondas, que de vez em quando nos molhavam. Por fim chegamos vivos e felizes.
Cochrane: fim da Carretera Austral.
Estávamos ansiosos para chegar a Cochrane, finalmente contato com civilização, mas Cochrane é uma cidadezinha tão pequena que não nos animou muito. O banco não aceitava nenhum de nossos cartões, o dinheiro estava no fim e tivemos que pensar no término da carretera. No banco conhecemos um italiano muito louco que junto com o amigo estão tentando bater um novo recorde. Eles estão viajando com duas motos 50 cilindradas e vão fazer do Ushuaia até o Alasca. A bagagem deles é menor que minha frasqueira. A moto só cabe 7 litros de combustível, não tenho a mínima idéia de como eles vão fazer essa loucura, mas vamos ficar acompanhando.
Aproveitamos nossos últimos dias da carretera para conhecer nossa última cidade da rota, Caleta Tortel, que fica à beira de um lago coberto de montanhas. Na cidade só se circula a pé, pois os caminhos são decks de madeira interligados por muitas escadarias, pois a cidade foi totalmente construída nas encostas das montanhas, dando um charme todo especial ao local.
Saímos do Chile em direção à famosa ruta 40 na Argentina através de Passo Roballos. A vegetação começa a ficar mais rasteira, árida e as montanhas mais baixas.
Podemos observar muitos grupos de guanacos e tivemos a sorte de cruzar com uma pequena raposinha que fez questão de parar e pousar para foto, ficamos ali alguns segundos nos entreolhando, até seguir nossos rumos.
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Olhando essas fotos e esses relatos todos me bateu uma saudade de vcs, mas ao mesmo tempo vejo que vcs estão fazendo o que gostam que é sair ai desbravando esse mundão … hahahha legal.
O blog ta muito bão, continuem atualizando sempre que der.
Então gostaria de desejar um feliz natal e um ótimo ano novo pra vcs onde quer que vcs estejam, porque a gente ta aqui sempre torcendo e contente por estarem fazendo o que gostam mas tbm com saudade da companhia de vcs.
Abraços Aline e Diogo
filha ,que lugar mais lindo!!!!!!!e que perigo hem!!!!tu estas magrinha hem. amo voces. se cuidem, e nada de esageros. feliz natal
Nossa, só de ler já me cansa, lembrei quando subi naquela morreba lá na serra que meu pé congelou, jurei nunca mais fazer aquilo, isso que foi só 1horinha hein. Só imagino a Hanna, hahahaha! O sofrimento.
Beijáo família. Muita saudades.